Capítulo 14
O quarto planeta era o do homem de negócios. Estava tão atarefado que nem sequer levantou a cabeça quando o principezinho chegou.
- Olá, bom dia! - disse-lhe este. - Tem o cigarro apagado!
- Três e dois, cinco. Cinco e sete, doze. Doze e três, quinze. Bom dia! Quinze e sete, vinte e dois. Vinte e dois e seis, vinte e oito. Não tenho tempo de o voltar a acender. Vinte e seis e cinco, trinta e um. Uf! Portanto, tudo isto soma quinhentos e um milhões, seiscentos e vinte e dois mil, setecentos e trinta e um!
- Quinhentos milhões de quê?
- Ah? Ainda aí estás? Quinhentos milhões de... Olha que já nem sei... Tenho tanto que fazer! Eu, eu sou um homem sério, não perco o meu tempo com ninharias! Dois e cinco, sete...
- Quinhentos milhões de quê? - repetiu o principezinho que, uma vez que a fizesse, nunca em dias da sua vida desistia de uma pergunta.
O homem de negócios levantou a cabeça:
- Vivo neste planeta há cinquenta e quatro anos e ainda só fui incomodado três vezes. A primeira vez foi há vinte e dois anos: era um besouro caído sabe Deus de onde. Fazia tanto barulho que me enganei quatro vezes numa soma. A segunda vez foi há onze anos: era um ataque de reumatismo. Tenho falta de exercício. Não me sobra tempo para andar por aí a vadiar. É que eu, eu sou um homem sério. A terceira vez... é esta! Mas, ia eu dizendo, quinhentos milhões...
- Milhões de quê?
O homem de negócios percebeu que não havia esperança de que ele o deixasse em paz:
- Milhões daquelas coisitas que às vezes se vêem brilhar no céu
- Moscas?
- Não, nada disso, coisitas brilhantes!
- Abelhas?
- Não, nada disso. Coisitas douradas que dão a volta à cabeça dos párias e dos vagabundos.
- Ah! Estrelas!
- Isso mesmo! Estrelas!
- E o que é que fazes com quinhentos milhões de estrelas? - Quinhentos e um milhões, seiscentos e vinte e dois mil setecentos e trinta e uma. Eu, eu sou um homem sério e gosto que as coisas sejam ditas com rigor!
- E o que é que fazes com essas estrelas todas?
- O que é que eu faço com elas?
-Sim.
- Nada. Tenho-as.
- Tu tens as estrelas?
- Tenho.
- Mas eu conheço um rei que...
- Os reis não têm nada. "Reinam" sobre as coisas. É muito diferente.
- E para que é que te serve teres estrelas?
- Serve-me para ser rico.
- E para que é que te serve seres rico?
- Para comprar outras estrelas, se alguém as descobrir.
"Este", comentou o principezinho com os seus botões, "este só parece o meu bêbedo a raciocinar."
No entanto, ainda lhe fez mais perguntas:
- E como é que se pode ter as estrelas?
- De quem são elas? - ripostou, todo embirrento, o homem de negócios.
- Não sei. De ninguém.
- Então são minhas. Eu fui o primeiro a pensar nisso...
- E isso basta?
- Claro que basta! Se tu achares um diamante e ele não for de ninguém, passa a ser teu. Se tu achares uma ilha e ela não for de ninguém, passa a ser tua. Se tu fores o primeiro a ter uma ideia, tiras-lhe a patente: é tua. Pois eu tenho as estrelas porque, antes de mim, nunca ninguém se tinha lembrado de as ter.
- Lá isso é verdade! - disse o principezinho. - E o que é que fazes com elas?
- Administro-as. Conto-as e torno a contá-las - disse o homem de negócios. - É difícil. Mas eu sou um homem sério!
O principezinho ainda não estava satisfeito:
- Olha, mas eu, se tiver um lenço, posso pô-lo à volta do pescoço e levá-lo comigo. Eu, se tiver uma flor, posso apanhar a minha flor e levá-la comigo. Mas tu, tu não podes apanhar as tuas estrelas!
- Pois não, mas posso pô-las no banco.
- O que é que isso quer dizer?
- Quer dizer que pego num papelinho e escrevo o número das minhas estrelas. E depois guardo o papelinho numa gaveta e fecho-a à chave.
- E mais nada?
- Mais nada.
"Que é uma ideia divertida, lá isso é!", pensou o principezinho.
"E bastante poética. Duvido é que seja tão séria como isso…"
É que, para o principezinho, as coisas sérias eram muito diferentes daquilo que as coisas sérias são para as pessoas grandes. Ainda disse:
- Eu, cá por mim, tenho uma flor. Rego-a todos os dias. Tenho três vulcões. Limpo-os todas as semanas. Porque também limpo o que está extinto. Nunca se sabe... É útil para os meus vulcões e é útil para a minha flor que eu os tenha. Mas tu não és útil para as estrelas!
O homem de negócios ainda abriu a boca mas não foi capaz de encontrar resposta de jeito. O principezinho foi-se embora.
"As pessoas grandes são, de facto, extraordinárias", foi o que foi muito simplesmente a pensar durante a viagem.